RIBEIRÃO PRETO, SP (FOLHAPRESS) – A técnica de enfermagem Lucia Oliveira se surpreendeu ao ver os novos horários de ônibus para se deslocar até Ribeirão Preto (a 313 km de São Paulo), onde trabalha.

Acostumada a ter cerca de 25 horários disponíveis diariamente, passou a contar com apenas 10, devido à pandemia do novo coronavírus, que limitou os horários de ônibus entre cidades do interior paulista e suspendeu viagens interestaduais.

Situações como a dela se tornaram comuns nas duas últimas semanas devido às medidas de isolamento social, principalmente o fechamento de estabelecimentos comerciais, que fez com que rotas oferecidas com abundância fossem limitadas.

“Já trabalho num local de risco e acabo tendo de ir muito antes para não chegar atrasada. Ou seja, fico ainda mais exposta por chegar quase uma hora mais cedo”, afirmou ela, que tinha oito opções de ônibus no intervalo de duas horas e que agora tem apenas duas.

Ela viaja pela viação São Bento, que reduziu em 70% sua frota em operação devido às restrições de abertura de comércio, seu principal público.

A empresa manteve suas linhas que operam entre cidades do interior –mas reduziu as opções de horários devido ao baixo número de usuários– e suspendeu as rotas interestaduais. Nesse caso, porém, após decisão do governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), que fechou as divisas. Com isso, rotas para Uberaba, Uberlândia, Passos e Araxá deixaram de operar.

A empresa informou que teve queda de 80% no total de usuários e que, além de a receita despencar, os custos aumentaram, devido à necessidade de ampliar a higienização dos veículos, agora feitas a cada parada no terminal.

Em São Carlos, polo universitário no interior, as operações no terminal rodoviário foram reduzidas a praticamente 10% do normal, num cenário que está espalhado em todo o interior, principalmente em Jundiaí, onde houve queda de 97% na circulação média de público no terminal rodoviário, segundo a Socicam, que o administra.

Já em Campinas, São João da Boa Vista e Ribeirão Preto, a redução foi de 90%, índices ligeiramente abaixo dos 93% registrados nos terminais Tietê, Barra Funda e Jabaquara, na capital.

“Seguimos atuando de acordo com as determinações oficiais e reforçando a orientação para que os passageiros entrem em contato com as empresas de ônibus para obter informações sobre remarcações, cancelamentos e reembolsos”, diz a empresa.

Passageiros que quiserem deixar Ribeirão Preto para ir para São Paulo pelas viações Cometa ou Rápido Ribeirão, que pertencem ao mesmo grupo, também estão com poucas opções em meio à pandemia.

Se antes do início das restrições que resultaram no isolamento social havia perto de 40 horários de ônibus diários entre as duas cidades, com intervalos que chegavam a ser de até meia hora, para embarque nesta quinta-feira (2) só estão disponibilizados três horários.

No sentido inverso, com partida do terminal Tietê, também só há três horários disponíveis para retornar a Ribeirão na sexta-feira (3).

As empresas do grupo tampouco estão fazendo o transporte entre a capital paulista e o Rio de Janeiro, também por conta de um decreto, este do governador Wilson Witzel (PSC).

A paralisação da circulação do transporte entre os dois estados se deve a um novo decreto do governador do Rio, válido inicialmente até sábado (4), que proibiu a circulação de ônibus interestaduais de passageiros originários de São Paulo e de outros estados com incidência da Covid-19.

Desde o dia 23, o grupo também tinha deixado de operar rotas para municípios mineiros e, três dias antes, já não cruzava mais a divisa entre São Paulo e Paraná, o que está vetado pelo menos até esta quinta-feira (2).

O setor gera cerca de 100 mil empregos diretos, segundo Flávio Maldonado, diretor da Anatrip (Associação Nacional das Empresas de Transporte Rodoviário de Passageiros), que correm risco frente à paralisação das atividades.

“Caso o governo não promova ações para ajudar o setor de transporte rodoviário interestadual, as empresas não conseguirão manter os empregos e, provavelmente, não terão outra saída, a não ser fechar as portas. O colapso das empresas prejudicará 80 milhões de usuários de baixa renda que dependem do serviço para se locomover”, disse.

Maldonado afirmou que, caso o setor não tenha apoio do governo para conseguir sobreviver a essa crise, a expectativa é de que em menos de 30 dias ocorra uma paralisia total das atividades. “Hoje a demanda de passageiros já caiu 100%, ou seja, as empresas perderam a integralidade de sua receita. Então, não há recurso para pagar as despesas que são altas. São mais de 30 mil motoristas, por exemplo.”

Entre os pedidos das empresas de ônibus estão a suspensão por 180 dias da cobrança de PIS-Cofins e da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) incidente nos combustíveis e do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre o diesel e o que é cobrado dos passageiros, nos estados. “Porém até agora o governo não propôs soluções para minimizar os impactos.”

Demissões já estão ocorrendo no setor, como na viação Cometa. A reportagem não obteve resposta da empresa. Já o transporte internacional de passageiros foi suspenso pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) desde o dia 18. A decisão é válida por 60 dias, podendo ser prorrogada.

Referência: https://gauchazh.clicrbs.com.br/geral/noticia/2020/04/pandemia-do-novo-coronavirus-dizima-frequencia-de-onibus-no-interior-de-sao-paulo-ck8hs54en00jh01objnzmofc2.html